Raaaaaaaaaaaaaa! Pensou que eu não voltaria mais em 2008, hein! Pegadinha do Malaaaaaandro!!!
Posto agora outro conto natalino. Este, publiquei dia 20 de dezembro do ano passado no Comunique-se. Espero que gostem:
O dia era típico de outubro para Papai Noel (ou Joulupukki, comumente conhecido na Finlândia), que já recebia os primeiros pedidos de Natal. Cartas de diversas partes do mundo chegavam à cidade de Rovaniemi, com pedidos não só de crianças, mas de alguns adultos também. De uma forma geral, os desejos não variavam: bicicletas, patins, carrinhos e bonecas. Já os adultos eram um pouco mais ousados: carros, piscinas...
Porém, depois de três horas abrindo os envelopes, Papai Noel atentou para uma carta da América do Sul. O lado exterior já chamava a atenção pelo colorido. Algumas pessoas pintavam a carta para que esta se destacasse entre as outras.
“Prezado Papai Noel,
é a primeira vez que escrevo para o senhor. Sei que está acumulado de serviços, mas o meu pedido é urgente. Diria que seja a última esperança. Moro no Brasil, onde sou humilhado, explorado e maltratado. O que ganho não é o suficiente para me alimentar. Por um bom tempo acreditei que a situação iria melhorar, mas essa hora nunca chegou. Não peço nada de muito caro, como mansão e casaco de pele; não peço vingança aos que me desprezam. Só peço uma vida digna, honrada. Só quero conhecer o lado feliz da vida. Não apenas trabalhar e dormir, mas diversão também.
Espero ser atendido.
Obrigado, Papai Noel.
Ass: Povo do Brasil”.
O Bom Velhinho realmente ficara emocionado com o texto. Há muito tempo ele não recebia um pedido de Natal que não fosse algo material. Desde a proliferação da publicidade e do avanço capitalista, principalmente nas últimas décadas, as cartas natalinas passaram a revelar o egoísmo enraizado no mundo. “Me lembro de uma menina, não devia ter 9 anos, que desejou o vestido mais caro do planeta para pôr inveja na amiga”, recorda com tristeza o Velhinho.
Entretanto, aquela carta tocara de verdade o coração do Papai Noel, que não tinha dúvidas: o primeiro pedido a ser realizado na madrugada do dia 25 de dezembro seria o do Povo do Brasil. Todos os outros países teriam que esperar um pouquinho mais.
Geralmente, ele começava a distribuição dos presentes pelo próprio país onde morava. Depois de completar a Europa, ele viajava para Ásia, Oceania, América do Norte, América Central e do Sul. Por último, a África, onde quase não haviam pedidos.
Os presentes no Brasil só costumavam chegar no finalzinho da madrugada, depois das 4h. Mas, dessa vez, seria o primeiro país. O povo receberia o presente aguardado com muita ansiedade.
Enquanto a população mundial externava a euforia com a aproximação do Natal, Papai Noel, geralmente, mantinha a serenidade. Já realizava aquele trabalho há anos e anos. Não sentia mais a motivação de antes. Bastava fazer o “feijão com arroz” de todo mundo e pronto!
Porém, esse ano era diferente. O Velhinho demonstrava entusiasmo com o advento do Natal. O motivo? Aquele pedido original do povo brasileiro. Nas redondezas de Rovaniemi não havia quem não notasse o ânimo diferente do Bom Velhinho. Conviver ao lado de um dos principais ícones da história se tornou habitual para os moradores da Finlândia. Afinal, eram vizinhos.
- Bom dia, “Joulupukki”! Teremos alguma surpresa especial este ano? Essa sua alegria não me engana! – comentou Aland.
- Cada Natal é especial, meu jovem. Todo ano uma alegria a mais – retrucou Papai Noel, sempre sorridente.
Já passavam das 22h do dia 24 de dezembro quando o símbolo natalino se preparava para a cansativa, mas prazerosa, tarefa que realizaria durante a madrugada. A pretensão era chegar ao Brasil bem à 0h. O trenó e as renas só esperavam o momento de partir.
No Brasil, o silêncio imperava quando Papai Noel aterrissou. Brasília seria a primeira cidade a ser contemplada com os presentes. Como todos ceavam nos respectivos lares, as ruas estavam desertas, o que contribuía para o espetáculo solitário das luzes que encantavam a cidade naquela época. Papai Noel sempre reconheceu que o Brasil era um dos países mais dedicados ao espírito natalino. Desta vez, entretanto, o Velhinho desconfiava que o povo sabia a surpresa. Os enfeites tinham um brilho especial, uma magia diferente, ainda mais encantadora.
Ao descer do trenó, o Velhinho foi surpreendido por um senhor bem vestido. Ele usava um terno preto, uma camisa branca e uma gravata verde escura. Os cabelos grisalhos acusavam a idade de, aproximadamente, 50 anos. Papai Noel se assustou, porque estava acostumado a agir sem ser visto. Assim ordenava a tradição.
- Olá, Papai Noel! Posso ter uma palavra com o senhor? – indagou o misterioso senhor.
- Desculpe, meu filho, mas estou bem ocupado. Como o senhor sabe, hoje é Natal e tenho muito trabalho durante a madrugada.
Não satisfeito, o homem insistiu, apesar da recusa do Papai Noel em perder tempo ali.
- Seja rápido, por favor. O mundo inteiro me espera.
O senhor de preto era um deputado federal e pretendia fazer uma proposta ao maior símbolo natalino. O parlamentar sentou-se no banco da praça onde estavam. Papai Noel, que preferiu permanecer em pé, rendeu-se após o primeiro garantir que o papo não demoraria mais do que cinco minutos.
- Papai Noel, antes de qualquer coisa, gostaria de confessar a minha enorme admiração pelo senhor. Sempre o considerei muito especial, desde criança. Mesmo depois de adulto, mantive o sentimento. Para os meus filhos, o senhor representa muito. Aliás, para as crianças do mundo inteiro. Mas, vamos ao que interessa.
Papai Noel mudou a expressão quando o deputado mostrou-se mais direto. A curiosidade tomou conta dele, que até então só estava preocupado com o trabalho. O deputado continuou:
- Sei que o povo enviou uma carta fazendo pedidos ao senhor. Mas, deixei de passar a noite com a minha família para impedir isso. O senhor não pode realizar os desejos.
- Como não?! Essa gente só quer melhorar a qualidade de vida.
- Exatamente. O senhor é inteligente e sabe que se realizar os desejos, muita gente vai ser contrariada, inclusive eu – disse o deputado. - Tenho uma proposta ótima para o senhor e para o povo de Rovaniemi.
A tensão tomou conta do ambiente. Os olhos não piscavam. Enquanto Papai Noel mantinha o silêncio para ouvir a proposta, o deputado tentava decifrar a mente do interlocutor. Ninguém piscava. Olho no olho. Quem desviasse o olhar seria considerado fraco. Papai Noel disse: “prossiga”. O deputado o atendeu:
- Tenho em mãos uma quantidade grande de dinheiro, o suficiente para qualquer um viver tranqüilo, sem preocupações. Seu povo também poderá desfrutar a quantia. É muito. Aposto que lá ninguém pensou em receber tanto.
O discurso não surpreendera Papai Noel, que, ao longo do papo, desconfiou da proposta. O que mexeu com ele foi o número de notas “vivas”. Realmente, o Bom Velhinho jamais vira tanto dinheiro. Eram notas altas e autênticas, como percebera.
Em troca do montante, bastaria não presentear o Brasil. De um lado, a vontade de ajudar a população daquele país, que vivia há tempos sob precárias condições. Do outro, a tentação de aposentar-se e proporcionar ao povo de Rovaniemi uma vida imensamente confortável.
Papai Noel sobrevivia cobrando taxas dos pais que levavam os filhos para visitar a casa dele. Após o Natal, o número de visitas caía a quase zero. A dúvida prevalecia, mas ele só decidiu o que fazer quando o deputado acrescentou:
- Eu dobro a quantia.
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