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terça-feira, 14 de outubro de 2008

A filosofia da maçã e do bolo de chocolate

Maitê Proença é meu novo ídolo, minha nova inspiradora. Todos deveriam basear-se na filosofia de vida pregada por ela. Maitê merece ser patrimônio mundial da humanidade, merece ser eleita a personalidade do ano pela revista Time. A imagem dela deveria virar selo (e caro!), deveria ser estátua na Av. Atlântica, ao lado de Carlos Drummond de Andrade, mas de frente para o mar.

"No fundo no fundo... eu não gosto de trabalhar. O que eu queria mesmo é ficar deitada numa rede, comendo maçã e bolo de chocolate", declarou Maitê durante entrevista concedida ao Jô Soares. Ela completou: "Esse negócio de correr atrás não traz felicidade".

Maitê sabe. Maitê conhece.

A civilização, hoje, é escrava da expectativa, está sempre à espera do futuro. "O que você vai ser quando crescer, menino?". A economia dos países está submetida às bolsas de valores, onde o capital é especulativo, líquido. Um espirro do presidente Bush deixa muitos latino-americanos gripados. Uma simples declaração de um sheik árabe tumultua todo o mercado de petróleo.

Hoje em dia nada termina. Tudo o que você faz é pouco, perto do que poderia fazer. O profissional é profissional 24h. O estudo e o trabalho são constantes. O capital (e tudo mais) é cumulativo. A programação da TV é continua. As grandes e médias cidades funcionam inclusive durante a madrugada... e por aí vai. Já dizia Cazuza: o tempo não pára.

Em contraste, há um movimento conhecido como Slow Europe. Os adeptos dele pregam uma opção de vida diferente da difundida pela Globalização, que obriga rapidez, estresse, competitividade, angústia, abstração e relações frias, inclusive entre membros da mesma família, gerando um caos comportamental.

Antes do Slow Europe, foi criado, há alguns anos, na Itália, o Slow Food, cuja proposta é a de valorização do tempo em que se come e, também, do próprio alimento. Diferentemente, o estilo de vida contemporâneo, do homem urbano, impõe o atropelamento de atitudes, comprometendo a produtividade e a qualidade do que se faz, inclusive o momento da refeição, muitas vezes ocorrida em um balcão de lanchonete, em pé.

A versão européia da revista Business Week publicou uma reportagem apontando que os franceses trabalham menos tempo do que os ingleses e americanos. Porém, a produtividade dos primeiros é superior em relação aos outros, cuja insatisfação e a necessidade de corrigir as atividades são mais freqüentes.

Por tudo isso, a filósofa Maitê nos lembra que contemplar também é viver; que comer maçã numa rede pode ser tão ou mais saboroso do que comer um hambúrguer no McDonald’s e que há limite para o trabalho, responsável pelo sufocamento do "eu" pessoal pelo "eu" profissional.

Pelo que sei, Maitê não escreve nada sobre tal visão de vida. Não publica livros, artigos em jornais e tampouco promove grandes eventos para proferir sobre o assunto*. Sócrates assim também não o fazia. Por volta de 360 anos a.C, ele pregava o pensamento através do diálogo, de uma conversa. Essa forma foi suficiente para ele ser reconhecido durante milênios. E é dessa forma que Maitê será lembrada por muito tempo ainda.

As próximas gerações conhecerão tal visão de vida através de registros como este. Serei o discípulo dela, o propagador dos pensamentos de Maitê Proença. Serei o Platão da Maitê, mas apenas Sócrates é Sócrates e Maitê é Maitê.

* Embora ela seja autora de dois livros, estes não tratam necessariamente do tema em questão. Os títulos das obras são: "Entre Ossos e a Escrita" e "Uma Vida Inventada".

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